Maior biblioteca rural

Acervo comunitário de 110 mil livros localizado no sertão da Bahia conquista recorde nacional

15/04/2014
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Maior biblioteca rural
Pintura de Vitor, 15 anos, monitor da Biblioteca do Paiaiá realizada no Ateliê de Pintura/ Foto: Acervo recordista
A Maior biblioteca rural do país é de São José do Paiaiá, povoado de 500 habitantes localizado no município de Nova Soure, a 250 km de Salvador (BA). O espaço batizado como Biblioteca Comunitária Maria das Neves Prado possui 110 mil livros (até abril de 2014).

Destes, aproximadamente 6,2 mil são exemplares raros ou especiais e 5,3 mil de literatura infanto-juvenil. O acervo conta com mais de dois mil CDs, 1,6 mil DVDs, 133 fitas de vídeo, 15 mil periódicos, cinco mil gibis, além de quatro computadores com internet, dois à disposição dos visitantes.

A Biblioteca do Paiaiá, como é conhecida, recebe cerca de 30 pessoas por dia e o maior público é formado por crianças de até 14 anos. No local também são realizadas outras atividades como escolinha de futebol, vôlei, xadrez e ateliê de pintura.

Implantada num povoado onde três a cada 10 moradores da região eram analfabetos, hoje o espaço vem modificando este cenário. Segundo professores da redondeza, os índices de reprovação caíram cerca de 20% com a instalação do ponto de leitura.

Além da biblioteca, agora também é mais fácil estudar. Atualmente, os alunos conseguem cursar o ensino fundamental um e dois (até o 9º ano) no vilarejo, quando terminam precisam se deslocar 12 km até Nova Soure para prosseguir com o curso. Aqueles que procuram o ensino superior podem optar por educação à distância, já que a faculdade particular mais próxima fica a 56 km ou a Universidade Federal da Bahia a 250 km.

Fachada da maior biblioteca rural do Brasil em São José do Paiaiá, município de Nova Soure (BA) / Foto: Acervo recordista

Apesar das dificuldades, já foi muito mais complicado concluir os estudos no passado. Assim como aconteceu na infância de Geraldo Moreira Prado, de 73 anos, idealizador do projeto. “Naquela época, queria fazer os cursos fundamental e médio, mas não tinha condições financeiras. Não poderia ir pra cidade grande. Tentei à distância e não deu certo. Mais tarde resolvi partir para São Paulo”.

Foi na metrópole que Geraldo trabalhando como faxineiro durante o dia e porteiro à noite pôde começar a estudar e comprar livros. Depois trabalhando como operário em uma fábrica decidiu prestar vestibular para medicina. Não passou, mas entrou em Línguas Orientais na Universidade de São Paulo (USP). Como a aula de chinês era ministrada em inglês, ele não aprendeu nenhuma das línguas. Em 1967, transferiu-se de curso para História.

Fez mestrado em Desenvolvimento Agrícola e outro em Cultura Brasileira, também doutorado em Desenvolvimento Agrícola e Cultura Rural do Brasil. Morou em Recife (PE) e Brasília (DF). Casou e divorciou-se nove anos depois.

Após a separação, ele vendeu o apartamento e teve dificuldade para acomodar sua coleção de 47 mil livros no novo imóvel que era menor. Durante uma conversa com o sobrinho José Arivaldo Moreira Prado, com 16 anos na ocasião, surgiu a ideia de instalar uma biblioteca no Paiaiá.

O jovem ficaria responsável por cuidar do acervo e coordenar as atividades, enquanto o tio disponibilizaria os livros e ministraria aulas aos visitantes. Arivaldo hoje aos 33 anos é formado em Letras e possui curso técnico de magistério. Recentemente ingressou na faculdade de Biblioteconomia em Aracaju (SE).

Geraldo Moreira Prado aguarda transporte para enviar livros do Rio de Janeiro ao sertão da Bahia / Foto: Acervo recordista

Em 2001, Geraldo enviou 12 mil volumes do Rio de Janeiro, onde vive e é professor universitário, para o sertão baiano aos cuidados do sobrinho. Essa foi a primeira remessa de várias que ainda aconteceriam. Até hoje ele recebe doações de livros que manda para o local.

Todo o trabalho feito na biblioteca é voluntário e ninguém recebe salário pela atividade no espaço mantido por doação. Arivaldo divide-se com José Francisco dos Santos para tocar o projeto, enquanto o tio dá aulas no Rio de Janeiro e vigia de longe, com olhar cuidadoso, a obra de que tem maior orgulho.

Segundo Geraldo, o título certificado pelo RankBrasil é uma confirmação. “Estou muito feliz e contente pois a professora Walnice Galvão da USP já havia dito e publicado em um artigo que a biblioteca comunitária era a maior do mundo em uma comunidade rural, mas também conquistamos o recorde nacional. É um diferencial para a comunidade e muitas pessoas que se preparam com nossos livros para o vestibular já estão formadas. É uma satisfação”.

Cerca de 6,2 mil exemplares do grande acervo são raros ou especiais e 5,3 mil de literatura infanto-juvenil / Foto: Acervo recordista

A Biblioteca Comunitária Maria das Neves Prado recebeu o nome de uma tia do historiador, professora de formação autodidata, que dedicou a vida para lecionar no povoado. De acordo com Arivaldo, a maior preocupação agora é com o analfabetismo funcional. “A educação aqui já melhorou, mas além de nos preocupamos com a leitura e escrita. Pensamos muito na compreensão das pessoas, para que não saibam apenas ler e escrever, mas que sejam críticos principalmente”.

Para Geraldo, existe um grande propósito por trás do projeto. “Quem sai do Paiaiá para a cidade costuma ser trabalhador em funções mais humildes ou como lamentavelmente já aconteceu no passado e continua acontecendo nos dias atuais, entra na marginalidade social. Vamos criar um trabalho um pouco diferente, mais suave pra eles? Se saírem do sertão, que seja para trabalhar com o que escolheram, investindo em uma carreira para não ser de um jeito tão sofrido como é para o pessoal que vive aqui”.

A Biblioteca do Paiaiá formou mais de 100 professores com cursos voltados ao incentivo à cultura, cinema na sala de aula e uso de novas tecnologias. O local fica aberto de segunda a sábado, das 8 às 17 horas, mas Arivaldo garante que quem precisar de um livro no domingo pode bater que ele abre também.

Redação: RankBrasil

Algumas citações na mídia:

News Rondônia
Rol News